Eu estava brincando de esconde-esconde como nos dias anteriores. Era minha brincadeira favorita, principalmente quando era minha vez de procurar os escondidos.
Contei até 30, como o combinado, e em seguida abri os olhos antes de mover-me para longe dali. Porém, assim que movi meu corpo e dei dois passos, senti uma dor próxima à minha barriga. Tentei continuar à andar normalmente, porém a dor só aumentou. Foi quando olhei para o chão e vi algumas gotas de sangue. Desesperei-me imediatamente e sem hesitar corri para dentro para procurar a tutora do orfanato. Eu estava assustada, não sabia o que era aquilo. Então eu apenas conseguia chorar..
***
A tutora logo veio até mim e me levou ao banheiro para me ajudar. O tempo todo ela estava calada, e aparentava também ter chorado, pois seus olhos se encontravam brilhantes e vermelhos. Eu não sabia bem o motivo, até porque ela era uma beata e beatas não costumam ter decepcões amorosas.
À perguntei por diversas vezes o motivo de sua tristeza, porém a resposta não veio. Única coisa que ela me disse, foi que eu não precisava ter medo, que o que ocorreu comigo era apenas minha primeira menstruação e que em breve tudo ficaria bem. Logo em seguida, assim que me tomei banho e vesti uma outra roupa, ela se retirou do banheiro e me deixou à sós com as dúvidas.
***
Mais tarde algumas pessoas esquisitas chegaram ao orfanato e foram diretamente conduzidas ao escritório da diretora. Vi tudo isso do andar de cima, ao lado de meu melhor amigo Marcus. O mesmo também estava com a mesma expressão que os demais meninos e funcionários, e eu — e creio que, as demais garotas também — não sabíamos o motivo de tanta cara de luto.
Será que ter a primeira menstruação era alguma maldição?
Bem, isso eu não sabia. A tutora não entrou em detalhes comigo..
— Me conta!? — virei-me para Marcus e cruzei os braços.
— O que? ele me olhou com a expressão de duvida.
— O motivo pelo qual todos estão com cara de luto! expliquei-o, descendo um degrau e sentando-me em um deles.
Esperei a resposta, porém Marcus calou-se.
— Por favor.. É importante para mim! — apoiei os cotovelos em meus joelhos e as mãos em minhas bochechas, numa pose de empurrada.
— Eu não posso, Tea! — a expressão de Marcus era de profunda tristeza.
— Está certo, não tenho amigos! — me levantei e logo tratei de sair dali.
— Espera! — Marcus chamou-me num tom alto e em seguida pude ouvir seus passos atrás de mim.
Parei de andar por um momento e cruzei os braços novamente.
— Isto custará a minha cabeça, porém não consigo esconder nada de você.. — ele deu uma pausa, suspirando — Essas pessoas estranhas que vimos chegar, vieram lhe buscar. Isso acontece à todos os anos, todas as garotas que sangram são levadas daqui pelas mesmas pessoas.. — continuou.
— O que? — o encarei, perplexa — Isso é algum tipo de adoção? E porque eu? Muitas outras vão sangrar daqui um tempo, e.. —
— Stella, venha comigo, sim? — a tutora surgiu de repente e tomou-me por uma das mãos.
À acompanhei sem hesitar e antes de adentrar o escritório, direcionei meu olhar à Marcus, imaginando que seria óbvio que esta seria a última vez que nos falamos ou que nos veríamos. E sofri por dentro, procurando não transparecer isto.
— Oh, que bom que logo à encontrou, irmã Carmen. — a diretora direcionou seu olhar para a tutora e em seguida para mim, assim que surgimos na porta.
Simultaneamente aqueles estranhos fizeram o mesmo, me examinando dos pés à cabeça.
Senti uma pontada de medo no estômago, porém tentei disfarçar. Nunca gostei de transparecer medo à estranhos, e não seria diferente agora.
— Esta é Stella, a menina do qual vos falei! — disse a diretora, para os estranhos, fazendo um sinal para que eu me aproximasse.
— Chega de formalidade, madama. Vamos logo com isso! — disse um dos homens ali presentes, tirando um envelope de sua bolsa e o jogando sob a mesa.
Parei de andar imediatamente em direção à eles, e agora pude sentir que o medo estava visível em minha face.
— Não tenha medo, princesa, você será bem tratada em seu novo lar! — disse o mesmo homem, agora me encarando. Em seguida o mesmo abriu um sorriso com malícia, e assim pude notar que alguns de seus dentes eram de outro.
Engoli em seco e direcionei um olhar de súplica para a diretora, e a mesma respondeu à isto movendo a cabeça negativamente. Suspirei, então, decepcionada e novamente encarei o homem. O mesmo ainda me encarava com o mesmo sorriso. De repente ele direcionou seu olhar para baixo e colocou uma das mãos exatamente onde ficava sua masculinidade.
— Contenha-se, senhor Nícholas! — a diretora o advertiu, com uma expressão séria.
Dei um passo para trás e fiquei próxima à tutora, e dali eu não saí até o momento de partir.
***
Mesmo em meio à lágrimas, tentativas de me renegociar, fui levada do lugar em que — apesar de aparentar ser um lugar de tristeza e solidão — foi onde tive os melhores momentos de minha vida. Onde nem conseguia pensar que fui deixada por meus tios, após vivermos em situação precária anos após perder meus pais. Ninguém permitia que tristeza dominasse a mente de ninguém, ali.
Despedir-me do lugar onde passei os melhores momentos de minha vida deu para superar. A pior parte foi me despedir de Marcus. Chorei desde quando o avistei, no momento que o abracei e assim que ele me entregou um presente.
Com certeza esta despedida foi a mais dolorosa pelo qual já passei, e a ferida que causou em meu coração jamais irá cicatrizar.
***
A carruagem parou em frente à um enorme e sombrio sobrado. Já havia anoitecido, e apenas o som de música dançante, não muito longe dali, podia ser ouvido.
Não havia vizinhança. Ao invés disso, havia uma floresta perfeitamente visível atrás da casa. E em frente a casa havia um enorme pasto. A escuridão dominava o local, então não dava para ver o gado.
Conforme fomos seguindo para a casa, pude notar diversos carros estacionados e mais alguns outros chegando. Não consegui identificar os tipos de pessoas que ali estavam, pois na hora que ia identificá-los, entramos no sobrado e as portas logo foram fechadas.
— Venha, vou lhe mostrar onde você passará a noite! — disse uma mulher, puxando-me com delicadeza escada acima.
À segui calada, apenas observando cada detalhe daquele local. O silêncio dominava todo o ambiente, até que de repente uma música pode ser ouvida novamente.
— O que é isto? — perguntei à mulher, enquanto seguíamos por um longo corredor de portas.
— É seu futuro, querida! — disse ela, com tranquilidade.
— Mas qual é o meu futuro? Não sei qual é o motivo da música.. — dei de ombros ao finalizar a frase e a encarei.
— Um dia desses você saberá.. — disse ela, parando em frente à uma porta e abrando-a — Entre! — ordenou-a.
À obedeci sem hesitar. Fitei todo o cômodo, e quando movi-me para seguir até à mulher e lhe perguntar mais, a porta se fechou. Segui até a mesma e ao pegar na maçaneta, pude notar que eu estava trancada.
Segui até a cama e me sentei. Logo uma tristeza profunda apertou em meu coração, e sem demorar, caí em lágrimas. Chorei por um longo tempo, até que adormeci.
Acordei horas depois, com o som da chuva estralando no telhado e fortes estrondos de trovão no céu. Notei que alguém havia estado ali, pois agora eu estava coberta com um edredom e algumas roupas limpas estava sob a cômoda.
Movi o edredom para o lado, e quando fui me levantar, senti algo duro em meu bolso que me causou um certo incomodo.
Me levantei e logo enfiei uma das mãos no bolso e encontrei um papel amassado. O abri imediatamente e pude ver que era um bilhete de Marcus.
Eu vou te encontrar e te tirar de onde você estiver, só tenha paciência para que eu fique forte como um super herói . Eu prometo. Minha promessa vai tardar, mas não vai falhar..
Marcus.
Lágrimas escorreram de meus olhos ao ler este bilhete de meu adorável e eterno amigo Marcus. Guardaria esta promessa sempre em meu coração, porém sinto que meu inferno estava muito longe de acabar. Faltava muito para que ele ficasse alto e forte como os super heróis. Porém, sua força de vontade é que me consolaria até o tão esperado dia.
Troquei de roupa logo em seguida em lágrimas. Marcus era meu primeiro e único amigo, chegamos ao orfanato na mesma época e crescemos juntos. Me doía ter que me separar dele.
Deitei-me ainda chorando e assim permaneci até adormecer novamente.
***
Stella Merchant-A Garota De Sorrisos Ensaiados é uma web novela criada originalmente por Thais Ribeiro, uma garota de apenas 17 anos. A história é resumida basicamente em sofrimento, onde no começo se inicia contando o pior dos sofrimentos vividos pela garota Stella. Sendo assim, a mesma cresce amargurada e acaba por se transformar em uma garota de sorrisos ensaiados no qual tem como explicação a falta de motivos para sorrir.